A autodisciplina é um dos mitos predominantes na nossa cultura. E o mito é gigante. Benjamin Franklin possuía autodisciplina, com seu hábito de acordar cedo, sua checklist de virtudes e sua reflexão diária. Os melhores atletas também a possuem, com a disciplina para treinar mais do que qualquer outra pessoa, visando ganhar o ouro. Meus leitores frequentemente pensam que eu sou mais disciplinado depois que leem meu livro e a lista de hábitos e realizações que conquistei, como conseguir me exercitar, acordar cedo ou economizar.
Mas é tudo um mito.
Estou confiante de que se você aceitar que a disciplina é um mito, vai se libertar da culpa de não ser disciplinado, passando a ter poder para criar os hábitos que você deseja, sem que haja necessidade dessa disciplina ilusória.
Por que a disciplina é um mito
Eu tenho escrito sobre a ilusão da disciplina por quase 4 anos e meio, mas é necessário revisitar o tema de vez em quando. Especialmente quando leio artigos que, se não estivessem espalhando e perpetuando tal mito, seriam excelentes. Então, preciso dar um fim a essa ilusão agora.
Veja bem, a disciplina soa como um conceito perfeitamente válido, até você ir mais fundo. Disciplina não é um mistério. Só que na verdade ela é. O que é disciplina? Quanto possuímos dela? Como conseguimos mais? Se é pela prática, como você a pratica se não possui nenhuma disciplina para começar? Se eu não estou com vontade de fazer alguma coisa, como eu uso a disciplina para me forçar a fazê-la?
Tive muitas conversas com pessoas que acreditam piamente no mito da disciplina. Geralmente, elas acontecem mais ou menos assim:
Eu: O que é disciplina, exatamente? Qual a diferença entre ela e motivação (que é um conjunto de ações que podemos de fato colocar em prática)?
Amigo: A motivação puxa você em relação a alguma coisa, fazendo você querer fazer algo. A disciplina te empurra para alguma coisa, fazendo você fazer aquilo que não quer.
Eu: Ok, então se eu não tenho disciplina, como faço para consegui-la?
Amigo: Você pratica. É um músculo, que se torna mais forte com a prática.
Eu: Mas como eu vou praticar se não tenho disciplina?
Amigo: Apenas faça algo pequeno e depois continue praticando repetidamente.
Eu: Mas é preciso ter disciplina para fazer isso. Que ação em específico eu tenho que usar para me forçar a fazer algo se eu não quero fazê-lo?
Amigo: Você se obriga a fazê-lo de todo jeito.
Eu: Mas isso exige a disciplina que eu não tenho. Ok, digamos que eu esteja no sofá e eu quero sair para correr ou levantar para escrever. Como me obrigo a fazer uma dessas coisas? Que ação em específico?
Amigo: Você visualiza o resultado final, algo que você deseja.
Eu: Esta é uma ação de motivação e não de disciplina.
Amigo: Certo. Então você tem que planejar recompensas. Não, isto é motivação. Você se convence e se anima e diz a você mesmo que pode fazê-lo. Não, isto é motivação também. Você diz às pessoas o que vai fazer, foca nos aspectos agradáveis disso. Mas isso também é motivação. Talvez você só deva fazer aquilo que gosta, então… o que também é motivação.
Tudo aquilo que fazemos para nos convencer a fazer algo não é disciplina, mas motivação. E é por isso que a primeira é um mito. O conceito pode soar bem, mas não é útil. Quando o assunto é investir em ações que levem você a realizar algo, o único caminho a seguir é o da motivação, não o da disciplina. Por anos, eu tenho desafiado pessoas a me trazerem uma ação de disciplina que não seja motivação, e ninguém conseguiu.
Construa hábitos para alcançar consistência
Quando as pessoas falam sobre querer disciplina em suas vidas, o objetivo real, geralmente, é ser mais consistente em alguma coisa. Exercícios físicos, meditação, escrever ou outra atividade criativa, finanças, alimentação ou produtividade no trabalho são algumas recorrentes. Todas essas atividades são executáveis sem o conceito da disciplina. O que você precisa para atingir esses objetivos é a construção de hábitos.
Hábitos não são bem entendidos por muitas pessoas, por isso eu criei o Curso de Hábitos. Neste curso, exploro o conceito de gatilhos, ciclos de feedback negativo e positivo, consistência, motivação, responsabilidade, apoio e outros fatores que ajudam a formar costumes.
Nenhum desses conceitos é nebuloso. Todos se traduzem em ações específicas que você pode executar no sentido de criar um costume. Se você quer ser consistente em alguma coisa, incorpore e execute ações que o levem a fazer desta coisa um hábito. Comece com coisas pequenas, para que esse processo de construção seja eficaz e bem-sucedido. Uma vez que a atividade estiver agregada à sua rotina, tornando-se de fato um hábito (e isso pode acontecer em duas semanas, dois meses ou mais tempo), você pode expandir a partir do que tem.
Hábitos são a chave para a consistência, não a disciplina. E eu posso garantir: uma vez que você constrói um hábito positivo e consistente é uma coisa maravilhosa. Você se sente disciplinado, forte, bom, mesmo vivendo como a personificação de um mito. É como os deuses gregos devem se sentir.
Tradução: Marcela Agra
Fonte - administradores.com.br